quarta-feira, 30 de julho de 2008

Professor

Numa segunda-feire preguiçosa, passeando pelo orkut, entrei na comunidade "Colegial Mackenzie" para ver se tinha alguma nova. E de fato tinha: fiquei sabendo por meio de um post que o meu professor de literatura/gramática do 3º Colegial tinha morrido em junho deste ano.
A notícia me marcou terrivelmente, e ele nem foi um dos meus favoritos. Nunca tivemos contato, mas suas aulas eram ótimas. Tinha especial simpatia quando ele dizia que análise sintática não servia para nada mesmo, lógico, eu que não entendia nada dessa matéria me sentia um pouco mais aliviada por ser algo que era comprovadamente (!!!) "inútil". Ao ver uma menina dormir numa aula, ele disse que não se importava se a pessoa cochilasse ou desmaiasse, mas ele sentiria vergonha de dormir um público.
Enfim, nem de longe são essas coisas mais marcantes que ele já falou em sala de aula, mas não sei porquê tenho essa mania de guardar na memória, com os mínimos detalhes, esses fatos "banais".
Não preciso nem dizer que a notícia me abalou muito, de maneiras que nem eu posso entender.

Hoje eu sonhei que ele estava dando uma aula sobre Guimarães Rosa, que escrevia sob um pseudônimo de um nome de mulher. Acordei com isso na cabeça "Guimarães Rosa, Guimarães Rosa, Guimarães Rosa...". Seriam resíduos da minha memória da aula que eu tive de verdade com ele? Ele dizia que ao ler "Primeiras Estórias" você pode não entender nada, mas no final do livro você sabe que captou algo, não sabendo exatamente o que. Eu, preguiçosa assumida (como disse no começo deste post), não li o livro no 3º Colegial e pedi para uma amiga me contar as estórias. Adorei todos os contos e automaticamente me arrependi de não ter lido o livro. Fui bem na prova, alías; tirei nota melhor que a minha amiga que de fato LEU o livro. E criou-se uma pendência na minha cabeça: ler o bendito livro "Primeiras Estórias".

Para terminar esse texto, vou citar o próprio Professor Ricardo:

"Às vezes, de repente, a gente se vê envolvido em um problema aparentemente sem solução. Surgem barreiras, obstáculos, abismos, mostrando-se intransponíveis. Tudo parecem trevas, uma noite fechada onde não há sequer estrelas, permitindo orientação segura. Bom mesmo, no entanto, é quando a gente, passado e resolvido o problema, percebe a própria capacidade de lutar, esforçar-se, aos poucos vislumbrar saídas, e finalmente encontrar a chave capaz de solucioná-lo. Melhor ainda, então, é notar que ela se encontrava, o tempo todo, em estado latente, dentro de cada um de nós." Ricardo Pantano Rodrigues

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Não beije

Segunda-feira típica: você acorda atrasada porque passou o domingo com os olhos estalados na frente da TV, não encontra um sapato que combine com sua roupa e perde tempo demais com a maquiagem. No ponto de ônibus, passa até feno na avenida, de tão vazia. Só passa Praça Ramos, Praça Ramos, Praça Ramos, um Lauzane, outro Praça Ramos, enfim, passou até o cometa Halley do Pq Edu Chaves e nada do Praça da Sé. Eis que chega o famigerado Belém, lotado de pessoas que como eu aguardavam por qualquer ônibus que virasse no Anhangabaú. Eu entrei. Senti o drama, ou melhor; o cheiro. Tenso. Pessoas aglomeradas nas portinhas, crianças chorando, pessoas sentadas dormindo de boca aberta, mas chega uma hora que você simplesmente releva tudo, prende a respiração e agüenta o caminho rápido até a Líbero Badaró. Já tinha passado pelo Viaduto do Chá quando ouvi um barulho nojentinho de lábios e saliva! Sim, perto da porta do ônibus avistei um casal dando beijo de língua! Eu nunca senti tanto nojo na minha vida, me embrulhou o estômago, foi pior que ver alguem vomitando do meu lado. A idéia de dar um beijo de lingua naquele calor humano do ônibus, no fedor de suvaco do velho que estava ao meu lado e nas pessoas enconstando em mim toda hora, era simplesmente inconcebível.
Quando finalmente o ônibus parou no meu ponto, simplesmente saltei junto com o casal apaixonado.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Maureen

Em 2000, eu tinha 16 anos, estava no segundo colegial, meu sonho de consumo era o CD (What´s the Story) Morning Glory do Oasis e eu era solteira. O vestibular ainda um evento distante, não sabia nem como se inscrever na Fuvest, muito menos qual faculdade cursar (cinema?). Surgiu a oportunidade de monitorar uma exposição de artes (!!!) na Fundação Japão, na Av. Paulista (!!!!) das 13 às 18 hrs. Ou seja, teria que passar em casa, me trocar e voar de casa com o "Aeroportozão" ou o "Terminal Santo Amarão". Mas ok, achei que ia agüentar numa boa, a exposição só iria durar um mês, seria divertido. Ainda mais, conseguiria comprar o CD que tanto queria.

O dia da abertura chegou, e eu usei o meu vestido mais chic; um preto de veludo, que ia até os joelhos, com uma meia calça roxa clara, sapatos pretos. Recepcionaria as pessoas, dando algumas instruções do que elas encontrariam lá dentro, etc etc etc.
Tema da exposição: Teatro Nô. Você sabe o que é isso? É um tipo de teatro japonês. Whatever. Tinha apresentação do Haroldo de Campos. Na exposição tinha também fotos da Maureen Bisilliat. Também não a conhecia.
Eis que ela sai do elevador. Também usava veludo preto, cabelos brancos, sempre sorrindo, muito simpática. Senti pela movimentação no hall que ela era relativamente famosa, ou no mínimo conhecida e respeitada pelo trabalho que desempenhava.

A exposição ocorreu bem. Um pouco parada demais, pois ficava no 7º andar de um prédio comercial na Paulista, onde você tinha que apresentar RG na recepção e tirar fotinho. Mas de vez em quando aparecia algum perdido visitá-la. Dei alguns cochilos inevitáveis na mesa da recepção. O meu despertador era o apito do elevador avisando que ia subir ou descer. Escutava o apito, levantava a cabeça; essa era a tática. Inveja absurda senti um dia quando chegou um boy com um saquinho do Restaurante América para a sala ao lado da minha. Fiquei imaginando: "será um great america? Um fetuccine com molho de 4 queijos?". Até hoje tenho fetiche por aquele saquinho do restaurante. Um dia ainda vou pedir América Delivery no meu trabalho atual.

Enfim, acabei me desviando do assunto. A exposição terminou, eu ganhei meus ricos R$ 150,00. Gastei-os todos na R Augusta no dia seguinte. Comprei:
- O bendito CD do Oasis (que gosto até hoje, me traz prazeirosas lembranças);
- O CD "Do You Like My Tight Sweater" do Moloko, por causa da música Fun For Me que tocava na propaganda de cigarros Luck Strike;
- Um par de sapatos roxo de couro da Banana Price na Al. Lorena (ainda os tenho!);
- Uma blusa branca (esta infelizmente não serve mais).
- Uma regata na loja A Mulher do Padre na Galeria Ouro Fino.

Olha que você poderia até fazer um estudo do poder de compra de 2000 com o de 2008, com tantas coisinhas que eu comprei naquele dia.


Sexta passada, jantei na Pizzaria Braz em Higienópolis. Na minha frente sentava Maureen Bisilliat, com uma moça (que parecia ser sua filha) e um homem. Ela manuseava um cordão prateado, que ora fazia de colar, ora de pulseira. Cabelos da mesma maneira penteados quando a vi pela primeira vez. O mesmo sorriso. De repente fui inundada com todas as lembranças daquele tempo na Av. Paulista em 2000... o envolvimento com arte, o cheiro gostoso do ar condicionado daquele prédio, o saquinho do América, a elegância do vestido de veludo, os meus "sonhos de consumo" comprados com meu salarinho na R. Augusta...